Acolhimento à demanda espontânea na Atenção Básica

Como vimos no tópico anterior, o acolhimento é uma diretriz da Política Nacional de Humanização. Antes de continuarmos o estudo sobre essa temática, vamos assistir ao vídeo a seguir, que proporciona reflexão importante sobre o papel do SUS no cuidado à saúde.

O SUS se resume a longas filas?

Fonte: (UFG, 2014).

Sabemos que os atendimentos de "porta aberta" nos serviços de saúde, em especial nas emergências, acabam por prejudicar aqueles usuários que realmente necessitam de atendimento de urgência/emergência, não que estes fiquem sem atendimento, mas por tomarem parte do tempo dos profissionais que poderiam se dedicar aos casos mais graves.

O que se observa nos serviços que atendem apenas por demanda espontânea é que, na maioria das vezes, a própria população resolve seus problemas de saúde, de forma imediata. Nesse modelo, o indivíduo define o que é urgência dentro do seu ponto de vista e cria os caminhos a percorrer na rede de serviços de saúde de acordo com as suas necessidades.

Significa dizer que, embora a Atenção Básica seja considerada uma das principais portas de entrada do sistema de saúde, as emergências e prontos-socorros em todo o Brasil ainda funcionam como portas de entrada do sistema, por operarem de forma ininterrupta nas 24 horas, na maioria dos serviços com demanda espontânea, e por possibilitarem respostas efetivas aos usuários que os procuram, mesmo quando, na maioria das vezes, encontram-se superlotados (BRASIL, 2013a).

Por essa razão, os serviços de urgência encontraram, na classificação de risco, uma maneira de qualificar o atendimento pela gravidade, e não pela ordem de chegada (MACKWAY-JONES; MARSDEN; WINDLE, 2010), dando oportunidade de acolhimento a todos, bem como definindo os tempos de atendimento médico de acordo com a necessidade de cada um.

Nessa perspectiva, a Atenção Básica tem participação importante nas Redes de Atenção à Saúde pela possibilidade de criar vínculo com os usuários e pela sua responsabilidade e atuação na realização de ações coletivas de promoção e prevenção no território, no cuidado individual e familiar, oferecendo serviços com maior grau de descentralização e capilaridade, que, por vezes, perpassam outras modalidades de serviços para atenderem às necessidades de saúde de modo integral (BRASIL, 2013a).

Pela importância e abrangência que tem, a Atenção Básica passou a vivenciar problemas com longas filas e superlotação de forma similar aos serviços de emergências, tornando necessária a reordenação da oferta no que concerne ao atendimento e ao horário de funcionamento das unidades de saúde. O Ministério da Saúde, então, publicou dois documentos relacionados ao acolhimento à demanda espontânea na Atenção Básica, os quais você pode conferir abaixo:

Clique nos cadernos para ter acesso aos documentos

Consideramos esses documentos como sendo materiais de leitura obrigatória para complementação dos conhecimentos a serem adquiridos neste curso! Nesses cadernos, são descritas as necessidades de a Atenção Básica tornar-se uma porta aberta capaz de dar respostas positivas aos usuários, não sendo apenas uma parada obrigatória de quem precisa de atendimento, levando em consideração a existência da hierarquização dos serviços (BRASIL, 2013a, 2013b).

Acompanhe os exemplos a seguir:

Pausa para o debate

Vamos discutir esse caso? Se André for transferido imediatamente para outro serviço de saúde, a unidade básica de saúde funciona apenas como ponto de passagem? Ou deve ser uma parada obrigatória para o usuário receber o encaminhamento? A unidade básica de saúde participa ou não da linha de cuidado no caso de André? Clique aqui para descrever suas impressões no fórum de discussões.

É pensando nesses casos que podemos diminuir os riscos das pessoas nas nossas unidades básicas de saúde, buscando atender à população da melhor forma e dando os encaminhamentos corretos em tempo hábil.

O acolhimento deve ser entendido, dentro dessa proposta, como uma forma de melhorar a atenção ao usuário, buscando atender suas solicitações, demonstrando interesse na resolução dos seus problemas, disponibilizando informações simples, como os horários de atendimento da unidade, os tempos de espera, até informações a respeito do seu estado de saúde, tratamentos e condutas (BRASIL, 2004a).

O acolhimento inicial conta com avaliação de riscos e vulnerabilidades, deve ser encarado como uma mudança de postura na relação entre profissionais e usuários, um dispositivo orientador da atenção e produção de saúde. Conheça algumas modelagens de acolhimento sugeridas pelo Ministério da Saúde (BRASIL, 2013a):

Acolhimento realizado pela equipe de referência do usuário

Essa modalidade pode ser melhor compreendida se tomarmos como referência o seguinte exemplo (BRASIL 2013a; BRASIL, 2017):

  1. Um usuário chega ao serviço como demanda espontânea;

  2. É direcionado para a equipe da unidade de saúde;

  3. O enfermeiro reorganiza a agenda do dia para que o usuário da demanda espontânea seja atendido primeiramente, por ele, até um certo horário;

  4. Após esse tempo predeterminado, o enfermeiro retorna a suas atividades agendadas para aquele dia, e o médico fica na retaguarda para os casos agudos que surgirem;

  5. Após escuta da demanda espontânea, o atendimento usual volta a acontecer, e, então, a próxima escuta fica a cargo do técnico de enfermagem, tendo o enfermeiro e o médico na retaguarda.

A grande vantagem dessa modelagem é a vinculação e responsabilização da equipe com o usuário, gerando confiança. A desvantagem é a dificuldade de conciliação com as outras atividades da unidade, como visitas domiciliares e atividades programadas.

 Atenção
Por esse modelo, quando ocorrer de ter grande número de atendimento por demanda espontânea, a equipe corre o risco de transformar a unidade de saúde em um pronto-socorro.
Equipe de acolhimento do dia

Funciona onde existe mais de uma equipe. As mesmas podem se revezar para realizar o acolhimento em dias definidos. O enfermeiro e o técnico da equipe, que ficam escalados para determinado dia, ficam na linha de frente na primeira escuta, e o médico fica na retaguarda para todos os casos, a não ser que a demanda seja muito grande e necessite da ajuda de outra equipe. Caso isso não aconteça, as outras equipes continuam a realizar suas atividades habituais.

  • Vantagem: não é necessário alterar as agendas das outras equipes.

  • Desvantagens: menor responsabilização e vínculo da equipe com a população adscrita e sobrecarga para a equipe que está escalada no dia.

Acolhimento misto

Nesse caso, cada equipe fica atendendo à demanda espontânea de sua área de referência até um certo horário ou até uma certa quantidade de atendimentos acordada entre as equipes. O enfermeiro atende, e o médico fica para os casos agudos. A partir do horário combinado para a volta às atividades agendadas, ou do momento que ultrapasse o quantitativo anteriormente estipulado, um enfermeiro que fica escalado exclusivamente para esses atendimentos passa a atender à demanda espontânea, e um médico fica exclusivo para os atendimentos dos casos agudos que ultrapassaram a quantidade estipulada pelas equipes. É feito rodízio entre esses profissionais que cobrem esses horários para cada dia. Esse modelo requer comunicação e entrosamento entre as equipes e gerenciamento das agendas.

Acolhimento coletivo

Ocorre com todos reunidos num mesmo ambiente.

  • Vantagem: envolvimento de toda a equipe na primeira escuta. É como se fosse uma grande triagem.
  • Desvantagens:ausência de privacidade, dificuldade para avaliação dos riscos e vulnerabilidades.

A escolha da modelagem do acolhimento vai depender de cada lugar e de cada grupo de trabalho, mas a melhor escolha será aquela que atenderá às necessidades da população. Para que isso aconteça, é necessário conhecer a comunidade e as equipes que são responsáveis.

 
Fonte: (UFPE, 2016).
Última atualização: quinta, 31 Jan 2019, 14:56